quarta-feira, 13 de abril de 2011

O TESTAMENTO DE MAX EISENHARDT

Pro blog não ficar tão parado, resolvi postar alguns textos antigos (até para colocar em perspectiva com os novos, e ver se evoluiu alguma coisa). Textos antigos estão fora de contexto, é claro. Então serão precedidos de uma pequena ambientação. Sobre o texto que segue: um de meus hobbies é ler histórias em quadrinhos (surpreso? Tipo, eu tenho um blog, a nerdice está implícita). Assim, é possível que algumas postagens tenham a ver com o tema (mas não pretendo me fixar nele). A postagem a seguir é de Fevereiro de 2011, encaminhada a uma lista de discussões da qual participo, a Quadrim. Escrevi numa madrugada de sábado, logo após ter lido a graphic novel “Maneto: Testamento”, que retrata em narrativa seqüencial os horrores do holocausto nazista, através dos olhos de um famoso personagem da Marvel.   


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Ganhei de aniversário, em novembro, a edição "Magneto: Testamento", da Panini Books.  Confesso que fiquei meio desgostoso, pois de todas as edições dessa coleção já lançadas (Homem-Aranha, Capitão América, Namor), a que menos tinha me chamado atenção foi a do Magneto. Não porque eu não goste do personagem, mas porque imaginei que era apenas mais uma versão para sua origem, com a ficção e pirotecnia de costume.

Ledo engano.

O Testamento de Magneto, que na história é ainda Max Eisenhardt, não tem nada a ver com os quadrinhos do personagem, ou dos X-men.  Ainda assim, se casa perfeitamente com sua origem, que compartilha da mesma raiz que milhares de pessoas reais ao redor do mundo.

A Graphic Novel nada mais é do que uma recriação em quadrinhos (com precisão histórica) do período mais negro da História recente da Humanidade, o Holocausto dos Judeus pelo regime Nazista. Esqueçam o texto piegas, as situações manjadas, ou os imensos recordatários que normalmente veríamos numa história de super-heróis sobre esse assunto. Nada disso vai nos atrapalhar. Apenas acompanharemos Max, um garoto judeu expulso de casa pelos nazistas, que testemunha a ruína de sua família, e os horrores do campo de concentração, desde as câmaras de gás até as fornalhas. Durante todas as mais de 100 páginas, Max faz uma única coisa: sobreviver.  Nada de lutas, nada de atos de heroísmo (não no sentido cinematográfico da coisa, ao menos), nada de poderes. Apenas um testemunho do horror nazista, e um testamento que poderia ser de qualquer um dos seis milhões de judeus assassinados há menos de 70 anos na História.

Não veremos Max tornar-se Magnus, ou Erik Lensherr, tampouco Magneto. Mas veremos a vida e morte de Max Eisenhardt (que sobreviveu a tudo, mas decidiu deixar de existir), narrada pelo belíssimo texto de Greg Pak. Veremos, como bônus, um apêndice contendo uma nova história em quadrinhos, que narra a vida real de uma sobrevivente do holocausto, e sua batalha até hoje para recuperar as obras que fez sob mando dos oficiais da SS. Ao final, um posfácio de Stan Lee, emocionante pela sua simplicidade e pelo poder que The Man ainda impõe às palavras.

Terminando a história, por algum motivo, me lembrei da atual situação da França, que expulsa ciganos e nega aos muçulmanos o direito a seus costumes. Pensando mais sobre isso, lembrei de Israel e da Palestina, e não consegui lembrar qual dos dois eu costumava apoiar, quando ainda estudava História no colégio. Me lembrei que na África dezenas de etnias ainda se matam umas as outras, como se fosse justificável determinar que esse ou aquele grupo de seres humanos tem mais direito à vida. Me lembrei da ineficiência completa da ONU em coibir tudo isso, embora esse seja praticamente seu único e mais importante fundamento de existência.

Mas ainda não cheguei na parte mais preocupante: escrevendo esse texto, lembrei da minha janta de sexta-feira com alguns amigos, há poucas horas, onde palavras como "pretos" e "colonos" foram usadas, e ainda serviam para diminuir de valor e importância outros seres humanos. Me dei conta de como 70 anos passam rápido, e de como estamos próximos de esquecer aquilo que a geração de nossos avós aprendeu com a Guerra (ou não aprendeu;  afinal, o que passaram disso tudo aos nossos pais, e o que eles passaram a nós?). Qual o próximo passo para nós, jovens evoluídos e cultos de hoje em dia, se começarmos a acreditar que somos diferentes, superiores, mais importantes ou mais dignos de quaisquer direitos do que outros de nossa mesma espécie? Estamos tão longe assim de admitir o sofrimento de outras pessoas, apenas porque são de outra cor, outra origem, ou simplesmente porque é mais conveniente separá-las de nós? De quantos ciclos ainda precisa a raça humana para não esquecer, jamais, que o preconceito é o primeiro passo da segregação, e a segregação é a justificativa para a guerra e a violência?

O Testamento de Max não respondeu a essas perguntas, mas me lembrou porque quadrinhos são importantes. Max pode ser fictício, mas houve tantos Maxes depois de 1945 quanto houve sobreviventes daquele inferno. Se sua história servir para lembrar quem quer que seja do que aconteceu aos judeus há poucas décadas atrás, então talvez ajude a evitar a repetição desse horror. Afinal, essa foi a última vontade de Max Eisenhardt.

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P-p-p-por hoje é só, p-p-pessoal.

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